ISSO NÃO É POSSÍVEL.
UM ABUSO QUE PRECISA SER DENUNCIADO
Nos
últimos meses, vários consumidores têm relatado o recebimento de cartas
e mensagens de instituições financeiras contendo um novo tipo de ameaça: a
possibilidade de apreensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e do
passaporte como forma de coagir o pagamento de dívidas antigas que não
podem mais AJUIZAR AÇÕES, pois as mesmas estão PRESCRITAS, sem qualquer
possibilidade de cobrança judicial.
NÃO É POSSÍVEL COBRAR EXTRAJUDICIALMENTE, INTIMIDANDO AO DEVEDOR DA FORMA ACIMA, QUANDO HOUVER PRESCRIÇÃO DA AÇÃO, ISTO QUER DIZER, QUANDO NÃO EXISTE MAIS PRAZO PARA AÇÃO JUDICIAL. ABAIXO VEREMOS SOBRE ISSO.
👉 O
argumento utilizado pelos credores costuma se apoiar na decisão recente
do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceu a constitucionalidade
do art. 139, IV, do Código de Processo Civil, legitimando a adoção de
medidas coercitivas atípicas para garantir o cumprimento de decisões judiciais.
Mas a pergunta é simples:
É legal usar essa decisão para intimidar consumidores na cobrança extrajudicial de dívidas prescritas? EXTRAJUDICIAL (fora do âmbito judicial)
A resposta é NÃO. E o objetivo
deste artigo é explicar por quê.
1. ENTENDA O QUE O STF REALMENTE DECIDIU
Em fevereiro de 2023, o STF analisou a ADI 5941 e declarou constitucional o art. 139, IV, que permite ao juiz — e somente ao juiz — determinar medidas atípicas, como suspensão de passaporte ou CNH, em casos excepcionais, dentro de um processo judicial e com observância dos princípios da proporcionalidade, razoabilidade e fundamentação concreta.
Em outras palavras:
- A
decisão não autorizou bancos a ameaçarem consumidores com
essas medidas.
- A
decisão não permite uso automático da suspensão de
documentos.
- E, crucialmente, tais medidas só podem ser aplicadas quando existir um processo judicial válido e ativo, no qual haja pretensão exigível.
2. A DÍVIDA PRESCREVE? NÃO. O QUE PRESCREVE É A PRETENSÃO DE AJUIZAR A
AÇÃO DE COBRANÇA OU EXECUÇÃO, E TEM UM PRAZO LEGAL
No Direito brasileiro, a PRESCRIÇÃO não apaga a dívida, mas extingue a pretensão de cobrá-la judicialmente.
É por isso que se diz que, depois de se efetivar a PRESCRIÇÃO, a dívida se transforma em um débito natural:
- O consumidor pode pagar se quiser;
- O
credor não pode exigir judicialmente;
- O
pagamento, se feito, é válido e não pode ser restituído.
Assim, o credor até pode continuar cobrando amigavelmente, desde que:
- respeite
os limites do CDC;
- informe
de forma honesta;
- não
ameace o consumidor;
- não
utilize métodos coercitivos ou enganosos.
Isso significa que cartas amigáveis, propostas de renegociação e comunicações moderadas são permitidas.
O que não é permitido é distorcer o alcance da decisão do STF para criar um cenário de terrorismo psicológico.
3. A PRÁTICA ABUSIVA QUE TEM SIDO RELATADA: COAGIR PELO MEDO
Muitos bancos e escritórios de cobrança têm enviado comunicações que afirmam, sugerem ou insinuam que, caso o devedor não pague imediatamente, poderão ocorrer:
- suspensão
da CNH;
- apreensão
do passaporte;
- impossibilidade
de viajar;
- impedimento
de exercer atividades profissionais.
O consumidor, leigo em Direito, ao ler expressões como:
“Medidas autorizadas pelo STF poderão ser adotadas” ou
“A
suspensão de documentos é possível em caso de não pagamento”, acredita que
existe um risco real e iminente — quando isso não existe,
especialmente quando estamos diante da prescrição, para a qual não há
ação possível.
4. POR QUE ESSA PRÁTICA É ILEGAL E INACEITÁVEL?
4.1. VIOLAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA
Cobrar
dívida prescrita é permitido.
Ameaçar com medidas judiciais que não podem mais ser propostas é violar a boa-fé, a lealdade e a transparência — pilares das relações de consumo.
4.2. PRÁTICA ABUSIVA DE COBRANÇA (ART. 39, CDC)
O
CDC proíbe:
- métodos
coercitivos;
- vantagem
manifestamente excessiva;
- ameaças
veladas ou explícitas;
- exposição
ao ridículo;
- informações
enganosas ou falsas.
A ameaça de suspensão de documentos, quando não há processo e não pode haver, se enquadra exatamente nisso: coação moral para forçar pagamento.
4.3. INFORMAÇÃO FALSA OU ENGANOSA
Utilizar uma decisão do STF fora do contexto — omitir que ela só vale dentro de processo ativo — configura informação enganosa, vedada pelo art. 37 do CDC.
4.4. ABUSO DE DIREITO (ART. 187, CC)
Mesmo quando o credor tem permissão para cobrar amigavelmente, ultrapassar limites éticos e jurídicos transforma um direito legítimo em ato ilícito.
4.5. POSSÍVEL DANO MORAL
Quando
a cobrança passa do limite e gera:
- medo;
- angústia;
- constrangimento;
- pressão
psicológica indevida;
- é plenamente possível a responsabilização civil.
5. A ASSIMETRIA DE INFORMAÇÃO E O USO DO MEDO COMO MOEDA
Aqui está o ponto mais grave:
Os credores sabem que:
- o
consumidor leigo não entende de prescrição;
- não
sabe o que é o art. 139, IV, CPC;
- não
conhece limites do STF;
- não
intui que dívida antiga não pode mais gerar processo.
E se aproveitam exatamente dessa vulnerabilidade para induzir o pagamento.
É uma forma moderna de ameaça velada, sofisticada no discurso jurídico, mas tão abusiva quanto as ligações agressivas de décadas atrás.
6. O QUE O CONSUMIDOR PODE FAZER?
- Guardar a carta/mensagem.
- Registrar
reclamação no Procon e no Banco Central.
- Notificar
extrajudicialmente o banco.
- Buscar
orientação jurídica.
- Propor
ação:
- declaratória
de inexigibilidade do débito;
- obrigação
de não fazer (para cessar cobranças abusivas);
- indenização
por danos morais, quando houver abuso comprovado.
7. CONCLUSÃO: COBRAR AMIGAVELMENTE É PERMITIDO; INTIMIDAR É CRIME DE CONFIANÇA
A decisão do STF sobre medidas atípicas não autoriza o que estamos vendo.
Usar essa decisão como ferramenta de medo é deturpar o precedente, violar direitos básicos do consumidor e fragilizar ainda mais pessoas que, muitas vezes, já se encontram emocional e financeiramente vulneráveis.
O papel do Direito — e especialmente da advocacia — é justamente restabelecer o equilíbrio e proteger o mais fraco da relação.
E isso começa por denunciar, esclarecer e combater essas práticas.
VOCÊ SABE O QUE É PRESCRIÇÃO?
PRESCRIÇAO É A PERDA DO DIREITO DE PRETENSÃO A AJUIZAR AÇÃO (AÇÃO JUDICIAL),POR QUE PARA ISSO TEM PRAZOS NO CÓDIGO CIVIL.
NÃO É PARA A VIDA TODA. TEM LIMITE
TERMINANDO O PRAZO DE ENTRAR COM AÇÃO JUDICIAL, O CREDOR TERÁ O DIREITO DE COBRAR AMIGAVELMENTE, POR CARTA, E OUTROS MEIOS EXTRAJUDICIAIS.
OS PRAZO PRESCRICIONAIS ESTÃO NOS ARTIGOS 205 e 206 do CÓDIGO CIVIL – LEI Nº 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002
· Lei: Lei nº 10.406
· Data da publicação: 10 de janeiro de 2002
· Entrada
em vigor: 11 de janeiro de 2003
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